terça-feira, 16 de julho de 2019

Distopia anunciada e resquícios de ficção científica


Em um futuro não muito distante penso em uma passado muito presente: Os seres humanos se tornam cada vez mais frágeis em seus antiquados corpos de carne, osso e dor, e cada vez mais assustados com suas gigantescas cidades de asfalto, metal e fúria. A velocidade das vias expressas oprime o pensamento, não há mais tempo para elucubrar, não há mais tempo para gozar se não com hora marcada. Quem abusar ou se desviar é vigiado e punido. Os corpos tem código de barra, controle remoto e entrada USB. As identidades são invenções do Instagram, ninguém mais pode ser infeliz agora, se não foi postado não aconteceu. As telas exigem nossa atenção e devoram nosso consciência do agora, as luzes cegam, as projeções confundem, os comprimidos de soma anestesiam sem necessariamente aplacar a dor das almas em ameaça de extinção. As máquinas gritam e as fábricas produzem incessantemente para um futuro de fartura e calmaria que nunca chega. O trabalho nos rouba e o Tempo agora tem um soberano, um Big Brother de visão panóptica, eleito por uma maioria muda que forma filas e aguarda o abismo enquanto devora os detritos e escombros de um passado sem data, deixado por ancestrais cínicos e niilistas, que maquinaram maquiavélicos o suicídio coletivo do planeta. Vestimos armaduras automobilísticas e aceleramos queimando petróleo para não sermos alcançados, erguemos monumentos falocêntricos para celebrar nossa impotência auto imposta e rezamos para que o deus Google diga nosso destino. Embaralhamos nossas memórias para esquecer e fingir neutralidade. Nos conectamos ao Todo para que esse seja Nada. Não existe mais o fora da Matrix. Reproduzimos o mesmo para que a diferença seja apenas um slogan. O vingador do futuro foi enforcado em uma fábrica no berço do capitalismo em meio a discursos de progresso infinito. Ele voltou e foi crucificado. Voltou de novo e foi baleado. Agora vive como indigente em uma região desolada pelo estouro de uma barragem. E assim aguardamos sentados no sofá o apocalipse e as vezes trocamos de canal para não nos entediamos com um fim tão óbvio. Enquanto isso as baratas observam o desfecho do Antropoceno  ansiosas por sua era de ouro na Terra. 

terça-feira, 9 de julho de 2019

O Tinder ou a busca pelo amor


Humano comum com tristezas comuns, pequenas conquistas, grandes frustrações, um fardo e um desejo secreto. Em busca de uma pessoa nada especial, com nome, com fome e carregando algum tipo de solidão. Vamos dividir uma cerveja em um confessionário entre santos e bêbados e partilhar a história de nossos erros. Contar nossas tragédias burlescas e fingir que somos personagens de uma série ruim da Netflix que não se pode parar de ver porque atrai a consciência, dissipa o tempo, acalma as horas e distrai o tédio dando sugestões ao desejo. Sim isso é um poema de amor! Ou será desamor?! 

quinta-feira, 18 de abril de 2019

Absurdo 02


Acreditar? Eu não! A fé é artigo publicitário e a verdade inútil para quem não pode carrega-la na bolsa. Prefiro encarar o olhar sem rumo da Loucura, poço sem fundo, coragem sem esperança. E fazer escolhas como quem vê figuras nas nuvens e interpreta o futuro nas vísceras de um animal morto. Mas afinal porque não? Quem sabe inventar uma mentira e mentir mil vezes, em mil páginas, por mil anos até esquecer que é mentira e virar poeta.  Não há nada a perder para quem a vida foi entregue sem perguntas nem respostas. O erro é irrelevante pois a realidade é inapreensível. Vale a pena tentar pois a morte tem hora marcada e não atrasa a eternidade. A palavra já é uma vitória humana! O grito uma conquista!  Se a experiência o tempo não comporta, uma migalha pode fartar uma existência inteira. 

terça-feira, 9 de abril de 2019

Poema Brasileiro


Domingo ensolarado. Cidade maravilhosa. País tropical. Por traz da miragem do corcovado, oitenta tiros, oitenta tiros foram disparados! Nesse Brasil outro, o horror governa disfarçado, fardado de ordem e progresso, fuzil nas mãos, assassinato. Oitenta tiros, oitenta tiros foram disparados! País latifúndio onde a lei é sangue e a lógica é clara, muito clara e apesar do passado ser negro e o presente ser negro, o futuro está ameaçado. Oitenta tiros, oitenta tiros foram disparados! Tá lá um corpo no chão. Era bandido? Era vilão? Foi confundido? Execução! O preço do sentimento de segurança é mais caro para alguns. Há os que votaram e os que foram votados, e tem aqueles que com um alvo são marcados cotidianamente e levam na pele o estigma dos escravizados. Oitenta tiros, oitenta tiros foram disparados! Quem no plenário e na tribuna denuncia o crime institucionalizado não vive para ver o resultado. A pergunta icônica ``quem matou Marielle`` já serve para tantos...Oitenta tiros, oitenta tiros foram disparados! Para um povo que insiste em apagar sua história genocídio é naturalizado. Aqui bala tem consciência e sabe quem deve ser eliminado, mas quem atira não, esse deve só estar engando. O guarda chuva parecia uma arma...tinha cara de suspeito... Coincidência? Despreparo? Ou terrorismo de Estado? Oitenta tiros, oitenta tiros foram disparados! Nesse gatilho que foi puxado, presidente e congresso, sociedade e soldados, todos são um tanto culpados. Uma família destruída, mas não a da propaganda de margarina. Oitenta tiros, oitenta tiros foram disparados! O presente repete o pior do passado, na Colônia, no Império, na República dos bestializados. Cidadania? direitos? Oitenta tiros, oitenta tiros foram disparados! Cidadania e direito em um carro fuzilados. Oitenta tiros, oitenta tiros foram disparados.