sábado, 27 de outubro de 2018

Tempo de Medo

A liberdade é o oposto do medo! Penso em todas as grandes obras cinematográficas que marcaram minha sensibilidade ao longo de minha vida até hoje. Obras de arte que me ensinaram sobre a história do meu país e sobre a crueldade humana, o autoritarismo, o fascismo, o Estado que devia ser a vontade do povo se voltando contra ele, brutal e insensível, uma máquina de tortura e extermínio. Lembro de cenas de filmes como: O que é isso companheiro, Terra em Transe, Barra 68, Que bom te ver Viva, Eles não usam Black Tie, Marighella, Cabra Cega, Batismo de Sangue. Belos e tristes filmes! Durante muito tempo tudo isso parecia ser o passado vencido, mas logo percebi, utilizando a formula de um velho amigo barbudo, que a História se repete...
            Hoje tenho medo do amanhã, me imagino como um dos personagens  reais desses filmes, vidas destruídas pela perseguição política, pela injustiça, pela violência, pela prisão, pela tortura. Poderei ser eu um guerrilheiro como Marighella? Executado pela polícia. Ou como os grevistas presos do filme Eles não usam Black Tie, ou os frades torturados em Batismo de Sangue, ou os estudantes perseguidos e presos do documentário Barra 68? Terei eu a coragem que eles tiveram? Não tenho pretensões de ser herói, mas valeria a pena viver subjugado?
            As primeiras ameaças soaram como uma piada de mal gosto ditas por um palhaço lunático com máscara de Bozo para esconder sua fome de poder. Impossível levar a sério! Mas elas continuaram, e outras vozes a ele se somaram, até que quando menos se esperava uma turba de ódio se formou e agora está a bradar em nossas portas. Em busca de uma caça às bruxas, de um inimigo comum, de um mal inventado que justifique o ódio dos homens de bem frustrados, que tem sede de sangue! O fascismo se transveste de ridículo para que os desavisados não acreditem nos anúncios da barbárie.  Quem deverá pagar pelos erros coletivos, pelo fracasso do pacto social, pelas ilusões do progresso, se não os mais fracos e aqueles que nunca se conformaram mesmo quando tudo parecia bem?
            Minha cabeça pesa de pensar nas conjecturas sombrias, nas análises labirínticas dos especialistas e dos populares, nas possibilidades que se apresentam a minha imaginação pessimista, envenenada, delirante. Que já não sabe se o tempo passou ou voltou. Lutei contra! mas me enganei com o absurdo, e a política do medo se alastrou por toda parte como moscas da má consciência que enfestaram meu quintal! Tento resistir... o espírito deve criar anticorpos! A doença traz a cura! Mas tenho medo... não posso... não devo negar... É meu, é parte de mim! Devo transforma-lo, como esses filmes fizeram em mim. Ou há resistência maior do que falar, lembrar?


Que o passado, no agora certo, seja revivido como coragem e não como medo.